Ao ler os comentários do meu blog, nessa segunda-feira, encontrei um ditado antigo citado pelo colega Chassot[1]: “Quando tens pressa, não busques atalho!” Esse ditado me fez recordar da infância quando atravessava matas, campos e riachos para conseguir chegar à escola. O fato, que relato aqui, aconteceu no início da década de 1960 e eu cursava a primeira série do ginasial noturno. Minha escola estava há seis quilômetros da casa onde me hospedava para estudar. As aulas encerravam-se às vinte e três horas e eu tinha pela frente uma caminhada de cerca de uma hora e pouco. Era inverno, a noite estava muito escura, chovia e decidi pegar um atalho que me fazia economizar cerca de vinte minutos. O guri já andava cansado, pois como trabalhasse todo o dia numa olaria, uns minutos a mais de sono me faria bem para a empreitada do dia seguinte.
Atravessei a vão da cerca que dava acesso a um mato de eucaliptos e o guri de doze anos se encheu de coragem. Caminhava apreensivo, mas feliz por encurtar caminho. De repente, um som forte e estranho veio de dentro do mato, no meio da escuridão. Confesso que me arrependi mil vezes de ter buscado aquele atalho. Tinha ganhado uma lanterna de pilha e, muito assustado, iluminei a escuridão na direção do barulho. Descobri que se tratava de uma vaca assustada com a minha presença e se levantara rapidamente para correr.
No meio da escuridão deu-se o encontro de dois apavorados: a vaca, com medo de um possível predador que lhe perturbava o sono e o ruminar no meio do mato e eu, com medo dos meus próprios fantasmas de guri, arrependido por invadir uma propriedade alheia para encurtar caminho.
A escuridão é o ingrediente que incendiou os nossos medos. Como de resto, a escuridão sempre provoca medos e produz fantasmas. Nossos dilemas existenciais, situações mal resolvidas, problemas sem solução sempre se transformam em gigantes quando estão envoltas pelo breu[2] da ignorância. Somente quando enfrentamos as diferentes situações, com o conhecimento, como quem tem a paciência de aguardar a aurora com sua luz vivaz, é capaz de perceber que nada é insolúvel. Há sempre uma maneira de encaminhar cada questão e para cada “problema” sempre há uma solução.
Pois é... depois percebi que a vaca se acalmou quando descobriu que era apenas um guri passando e eu... de perna bamba prossegui o meu caminho com mais medo ainda.
Meu caro Mestre Garin,
ResponderExcluirduas dimensões – pelo menos – se fazem emergente neste blogar. Uma, a admiração pelo guri-oleiro diurno e pelo estudante-andarilho noturno e esse pia que como humano também tem medo do escuro se fez doutor e reitor de uma prestigiada instituição universitária. Outra, o milenar medo que os humano tem da escuridão, e como a descoberta da conservação do fogo (recordo o filme “A guerra do fogo”) ajudou/ajuda/ajudará (com seus sucedâneos) a afugentar medos.
Obrigado por fazeres de teu blogue um púlpito pós-moderno do qual a cada dia é irradiada luz para afugentar medos.
Com encantamentos
attico chassot
Caro Chassot,
ResponderExcluircomo é bom olhar para trás e lembrar dos episódios que atravessamos. Agora, eles têm um outro sabor, bem mais divertido, mas no ato da coisa em si, não tinha graça nenhuma.
Obrigado pelas tuas palavras acarinhadas para com a minha pessoa.
Desejo-te uma ótima quarta-feira!
Garin