quarta-feira, 4 de abril de 2012

Imoralidade - ano 02 - nº 388

IMORALIDADE
ANO 02 – Nº 388

Ana e eu almoçávamos num Buffet, outro dia, quando se sentaram próximos, duas mulheres parecendo ser mãe e filha. Não sei o que está havendo, mas parece que as pessoas estão falando mais alto do que há alguns anos. Creio que a poluição sonora das cidades grandes e movimentadas, acaba por provocar certa dose de ‘surdez’ às pessoas normais. Mesmo distantes duas mesas era possível acompanhar a conversa como se estivéssemos ao lado delas. O conteúdo da conversa girava em torno de imoralidades cometidas no recinto do trabalho da filha. Algo que tinha a ver com pagamento de salário a menor do que o combinado. O tom subia e descia conforme as paixões se juntavam aos argumentos inflamados em defesa da justiça e da moralidade. Por pouco não desfraldaram uma bandeira, no meio do restaurante, para declarar sua posição pela “justiça e pela moralidade”!

O tempo passou e, como tivessem almoçado mais rápido que nós, acabaram levantando de suas mesas antes. Olhamos para o lado e reparamos que ambas haviam deixado seus pratos quase pela metade. Porções de carne de diferentes tipos, saladas e legumes haviam sobrado pelas bordas dos pratos, algo que daria muito bem para sustentar outras duas pessoas.

Depois da saída das ‘batalhadoras’ da justiça e da moralidade, ficamos comentando sobre a dificuldade que as pessoas têm de estabelecer diferenças e relações entre a ética e a moralidade. Os conturbados valores da contemporaneidade têm sido defendidos quando a situação se aplica à individualidade da minha pessoa. A reflexão ética não ultrapassa o ‘mundinho’ particular de cada um e só consegue ver a imoralidade nos outros. O desperdício de alimento numa refeição frugal é tão imoral quanto reter, indevidamente, parte do salário de um trabalhador. Ambas as atitudes são igualmente imorais porque rompem com valores que são caros à sociedade. Entretanto, o egocentrismo exacerbado da atualidade não permite fazer um exame crítico da própria moralidade.

No momento lembrei de certo senador que bradava enraivecido, de sua tribuna, contra a imoralidade de colegas e, recentemente, foi surpreendido, em ligações telefônicas, cometendo imoralidades tão ou mais graves do que aquelas às quais denunciava apaixonadamente.

Está aí um tema sobre o qual precisamos nos debruçar antes que nossa convivência social se transforme num caldo malcheiroso e  de aspecto horrível, contaminado pela incompetência moral de seus atores.

Com votos de uma quarta-feira de coerência ética!
DESTAQUE DO DIA

Morte de Ianni (8 anos)

Octavio Ianni nasceu em Itu, SP a 13 de outubro de 1926 e morreu em São Paulo a 4 de abril de 2004. Foi um sociólogo brasileiro. Formou-se em ciências sociais na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da USP, em 1954. Logo após a formatura, integrou o corpo de assistentes da Faculdade, na cadeira de Sociologia I, da qual Florestan Fernandes era o titular. Foi um pensador devotado à compreensão das diferenças sociais, das injustiças a elas associadas e dos meios de superá-las. Aposentado pelo AI-5 (e proibido de dar aulas na USP), foi para a Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), integrou a equipe de pesquisadores do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (CEBRAP). Suas principais obras são: "Cor e Mobilidade Social em Florianópolis" (1960, em colaboração), "Homem e Sociedade" (1961), "Metamorfoses do Escravo" (1962); "Industrialização e Desenvolvimento Social no Brasil" (1963), "Política e Revolução Social no Brasil" (1965), "Estado e Capitalismo no Brasil" (1965), "O Colapso do Populismo no Brasil" (l968). Também devem ser citadas "A Formação do Estado Populista na América Latina" (1975), "Imperialismo e Cultura" (1976), "Escravidão e Racismo" (1978), "A Ditadura do Grande Capital" (1981), "Classe e Nação" (1986), "Dialética e Capitalismo" (1987), "Ensaios de Sociologia da Cultura" (1991), "A Sociedade Global" (1992).[1]


[1] OCTAVIO IANNI. Disponível em http://pt.wikipedia.org/wiki/Oct%C3%A1vio_Ianni. Acesso em 4 abr 2012.

2 comentários:

  1. Meu caro Pregador da cotidianidade,
    dois assuntos fulcrais do hodierno:
    1) como somos colocados, sem respeito dentro da intimidade das pessoas. Sabes o quanto sou usuário de ônibus, sendo constrangido a ouvir conversas telefônicas e outros quetais...
    2) o desperdício de comidas em restaurantes ditos a quilo. Chegou se ensaiar uma prática de cobrar uma taxa ~~ o que seria justo ~~ pelas sobras no prato.
    Uma boa quarta-feira santa
    attico chassot

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    1. Amigo Attico,
      tuas observações nesse comentário são centrais para a ética e a moralidade. Já não sabemos mais quando estamos ou não incluídos nas conversações privadas-públicas do dia-a-dia.
      Um abraço,

      Garin

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