O CHORO
ANO 02 – Nº 403
Na poltrona da frente, um casal tentava acalmar uma criança de
poucas semanas que chorava convulsivamente. Espremido na fileira do meio, eu me
esforçava para digitar a postagem de hoje. Não deu! Considerei mais prudente
deixar para a madrugada de hoje, com mais tranquilidade, descrever, daqui de
Brasília, essa experiência estressante. Não há como culpar ninguém. Em virtude
do cancelamento dos voos da manhã em virtude do nevoeiro, partindo de Porto
Alegre, os aviões da tarde saíram quase todos abarrotados.
Entretanto, o que me chamou mais a atenção foi o drama que
aquele casal jovem passava. Não tem como a gente não se colocar no seu lugar. A
necessidade de viajar era imperiosa, estavam voltando para casa. A criança não se
sentia à vontade e o seu desconforto, compartilhado por todos os passageiros
espremidos, era manifesto através da única forma de protestar. Não tinha como desfraldar
uma bandeira no meio do avião para mostrar seu descontentamento. Só que isso
acrescentava mais desconforto aos demais passageiros. Quando uma criança dessa
idade chora, chora de verdade. Ela não está fazendo isso para chamar a atenção dos
comissários. Está precisando de atendimento que a jovem mãe se esforçava para realizar.
Relacionei com o choro de todos que vêm para essa cidade,
partindo de todos os recantos do nosso país. Muitos deles seriam como o daquele
bebê que reclama dos desconfortos a que são submetidos pelas adversidades
sociais. Ao invés de chorar convulsivamente, o que provocaria ações populares
de socorro, levantam suas bandeiras de reivindicações justas e louváveis. São populações
desapropriadas de seus espaços, gestores oprimidos por situações catastróficas
em suas cidades, camponeses necessitando de amparo e apoio para seu pedaço de
terra etc. São choros que, embora importunando os demais, não têm como se calar
quando a situação se mostra desesperadora.
O choro daquela criança fez eclodir o desconforto dos
passageiros que estavam ao seu redor. As manifestações dos que protestam por
aqui faz aflorar os desconfortos sociais e individuais que todos sentimos como cidadãos.
Considere-se nessa esteira, impostos muito altos, situação precária da saúde pública,
aumento dos casos de corrupção, leis parciais que favorecem parcelas da
população, desmandos de autoridades etc. O choro social de uns aflora o clamor
individual dos demais e assim nos sentimos todos num mesmo cordão de lamentos e
de demandas múltiplas. Ainda bem que estamos sob um sistema democrático de
direitos, no qual é possível chorar e reivindicar. Já vivi tempos nos quais
isso era motivo de prisão e de tortura.
Mesmo tendo consciência de que houve muitos avanços, o espírito
humano não cessa sua caminhada em direção ao aperfeiçoamento da justiça social.
O que nos satisfazia no final da década de 1980 hoje é bandeira de lutas por
algo maior, mais condizente com o patamar de crescimento que experimentamos.
Pois é, um choro leva a outro e os choros não devem cessar
porque são deles que nascem o atendimento das demandas justas e honestas. Uma sociedade
não pode se acomodar com aquilo que conseguiu conquistar: sempre haverá espaços
para novas demandas.
Com votos de uma quinta-feira repleta de reflexões sobre os
choros que nos rodeiam!
DESTAQUE DO
DIA
Aniversário de
Lygia Telles (89 anos)
Lygia Fagundes Telles, nascida Lygia de Azevedo Fagundes nasceu em São
Paulo a 19 de abril de 1923 e é uma escritora brasileira, galardoada com o Premio
Camões em 2005. É membro da Academia Paulista de Letras desde 1982, da Academia
Brasileira de Letras desde 1985 e da Academia das Ciências de Lisboa desde
1987. Em 1938, dois anos depois da separação dos pais, Lygia publicou o seu primeiro
livro de contos, Porão e Sobrado com a ajuda de seu pai, assinando como Lygia
Fagundes. Em 1944 publicou o livro de sucesso Praia Viva. Em parceria com Paulo
Emílio, fez uma adaptação para o cinema do romance de Machado de Assis, Dom
Casmurro, para o cineasta Paulo César Sarraceni - adaptação que adotaria a
alcunha da personagem principal: "Capitu".[1]
Essa é apenas uma pequena parte da sua grande obra.
[1]
LYGIA FAGUNDES TELLES. Disponível em http://pt.wikipedia.org/wiki/Lygia_Fagundes_Telles.
Acesso em 19 abr 2012.
Muito querido Garin,
ResponderExcluiro comentário procede desta Uruguaiana que faz parte de tua história. A cidade me recebeu com uma chuva que parece abençoar a terra com seu seres vivos.
Acompanho no teu relato o nevoeiro que ontem infelicitou a muitos, transtornando voos.
Lamento que não possas ter feito como eu (de ônibus) tua viagem.
Obrigado pelos votos pela parição de ‘Memórias de um professor: hologramas desde um trem misto’ que postaste em meu blogue.
Um bom dia e cuida-te de contatos com o Cahoeiro aí no centro do Poder,ãttico chassot