domingo, 18 de março de 2012

Os amendoins - ano 01 - nº 373

OS AMENDOINS
ANO 01 – Nº 373

Conta-se que certa vez um menino foi à bodega comprar amendoins. Ao chegar à venda[1] perguntou ao bodegueiro[2]: “quanto custa um quilo de amendoins?”. A resposta que recebeu dizia que aquela quantidade de amendoins custava dois cruzeiros[3]. O menino meteu a mão no bolso e retirou um punhado de moedas correspondendo à importância anunciada e pediu que pesasse um quilo de amendoins. O bodegueiro foi à tulha[4], mergulhou a concha e começou a colocar amendoins dentro de um saco de papel. Menino e bodegueiro ficaram atentos ao ponteiro da balança. Quando esse atingiu a marca de um quilo, ambos desviaram o olhar do ponteiro, satisfeitos.

O bodegueiro olhou para menino e resolveu acrescentar uma pequena quantidade de amendoins dentro do saco. Os olhos do menino brilharam e abriu-se um largo sorriso em sua boca. O bodegueiro fechou o pacote e o menino saiu saltitante caminho de volta.

Quando o ponteiro da balança atingiu um quilo, os dois desviaram o olhar do ponteiro porque havia se estabelecido a justiça: dois cruzeiros correspondiam exatamente a um quilo. Bodegueiro e menino estavam satisfeitos, não era mais necessário vigiar pelos direitos das partes. Porém, quando o bodegueiro decidiu acrescentar um punhado a mais ao pacote de amendoins, sobre o qual não receberia paga em dinheiro, o sorriso do menino se abriu porque ele sentiu a generosidade do comerciante. Essa atitude correspondeu a uma porção de graça, sem contrapartida.

A teologia cristã fala desses dois conceitos. A justiça e a graça. A justiça corresponde ao equilíbrio entre o dever e o direito da pessoa. Ela se estabelece no nível humano das ações de cada um de nós. Nossa ética sempre nos cobra o cumprimento da justiça. Somos levados a corresponder com o nosso papel na exata proporção da paga que recebemos.

A graça pertence ao nível divino. É aquela porção que ultrapassa a justiça, pois acrescenta bondade, que vai além do equilíbrio entre demanda e paga. Isso não acontece no nível humano, pois esse sempre que faz algo bom, intimamente pensa nalguma recompensa no futuro. Somente Deus é capaz de acrescentar bondade à justiça sem contar com a respectiva paga. Essa é uma dívida impagável visto que não há dinheiro para correspondê-la, em nenhum lugar. Tudo o que fazemos apenas corresponde à justiça, só Deus a excede!

Com os votos de um Quarto Domingo da Quaresma de meditação sobre a Graça de Deus!
DESTAQUE DO DIA

Morte de Erich Fromm (32 anos)

Erich Fromm nasceu em Frankfurt am Main a 23 de março de 1900 e morreu em Muralto a 18 de março de 1980. Foi um psicanalista alemão, filósofo e sociólogo. Ainda nos anos 1950, a maioria dos sociólogos seguia o chamado relativismo sociológico: Estavam convencidos de que o ser humano era totalmente maleável e que poderia viver em quase todas condições. Disto, concluíam duas coisas: 1. Uma sociedade que em princípio funcionasse, seria saudável; 2. As doenças psíquicas eram uma consequência de erros no indivíduo; os doentes psíquicos não teriam sido suficientemente capazes de se adaptar.

Fromm defendia frente a essa tese um humanismo normativo: O ser humano tem, não apenas necessidades básicas físicas, mas também necessidades básicas psíquicas, enraizados em sua existência.

Disto é possível concluir que para a saúde psíquica do ser humano existem critérios que podem ser ou promovidos ou oprimidos por um dado sistema social. O estado de saúde de uma sociedade pode, portanto, ser examinado.

Realmente, o ser humano pode viver sob diversas condições, mas se estas forem contrárias a sua natureza humana, ele reage a elas, ou mudando as relações existentes, ou abdicando de suas faculdades humanas condicionadas à razão, por assim dizer, distanciando-se, tornando-se apático.[5]


[1] Estabelecimento comercial de secos e molhados do interior do Rio Grande do Sul, Brasil.
[2] Atendente e, normalmente proprietário, da venda.
[3] Moeda antiga que circulou em diferentes épocas no Brasil.
[4] Recipiente onde eram armazenados as mercadorias.
[5] ERICH FROMM. Disponível em http://pt.wikipedia.org/wiki/Erich_Fromm. Acesso em 18 mar 2012.

2 comentários:

  1. Meu prezado colega pastor do cotidiano,
    deixo a tua teologia pendurada em um gancho atrás da porta do bolicho e agradeço a possibilidade de revisitar um armazém de minha infância.
    Mais tarde quando por ano trabalhei em bar em Porto Alegre, como na bodega de minha infância a BALANÇA imperava solene, como dizes marcando a JUSTIÇA.
    Um bom quarto domingo da quaresma,

    attico chassot
    http://mestrechassot.blogspot.com

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    1. Amigo Chassot,
      a visão dos bolichos de campanha ainda são muito fortes em minha memória. Sempre me dirigia à venda com uma lista de pedidos que, se esquecesse, custava uma tunda de relho.
      Um abraço,
      Garin

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