sexta-feira, 15 de julho de 2011

Caros(as),

O que significa chamar alguém de ‘caro’? Lembro de papai falando comigo junto ao mercadinho: “não, meu filho, não dá para comprar isso... é muito caro!”
Há certos momentos nos quais fico pensando sobre o significado desse tratamento. Seguidamente iniciou os meus e-mail com ‘caro’, ou ‘cara (quando se trata de alguém do sexo femino)... e aí paro um pouquinho: melhor seria ‘prezado’; ou ‘estimado’ seria mais adequado? Quando devo utilizar uma ou outra forma de tratamento? Qual seria mais formal e qual seria mais íntima?
Pois é, nem sempre refletimos sobre essas coisas. O tratamento ‘caro’ parece remeter a uma espécie de conquista, uma aquisição que nos custou um alto investimento. Contudo, as pessoas não são mercadorias, ou coisas que alguém possa mensurar o seu ‘preço’. É bem verdade que por aí afora tem gente se vendendo até por menos de trinta moedas de prata, mas esse não é o caso quando tratamos com pessoas próximas, amigas. O certo é que por trás de um ‘caro’, está uma aproximação bem maior do que um mero relacionamento comercial.
Só utilizo ‘caro’ para pessoas com as quais convivo no cotidiano, física ou presencialmente (ou nas duas dimensões). ‘Caro’ denota uma aproximação construída nas trocas de ideias e de gentilezas. É a forma delicada e gentil de dizer que aquela pessoa, que está recebendo a comunicação, seja carta, telegrama ou e-mail, tem um “preço” alto, um preço que não pode ser quantificado em moedas. Trata-se de um preço medido através de convivências prolongadas, de trocas significativas, de lutas conjuntas, de conspirações[1] etc. Tratar alguém por ‘caro’ é uma distinção nobre porque reflete a proximidade de quem é capaz de se alegrar com as vitórias do outro(a) ou de chorar junto com as suas tristezas. É manifestar a disponibilidade de quem está pronto a ‘emprestar o ombro’ para consolar e animar a pessoa a quem se chama por ‘caro’. Só deve ser empregado para quem nutrimos certo carinho, uma pessoa querida, mas que não temos a intimidade suficiente para tratarmos de ‘querido(a)’.
Pois é, nunca tinha parado para pensar assim, sobre essa forma de tratamento. ‘Prezado’ é formal, empregado na linguagem comercial. ‘Estimado’ se usa normalmente para familiares. ‘Querido’ é empregado para pessoas íntimas (namorados, consortes matrimoniais, filhos(as).
Acho que chamamos de ‘caro’[2] apenas àquelas pessoas pelas quais estamos dispostos a  andar um uma milha a mais, mesmo não sendo do nosso círculo familiar.


DESTAQUE DO DIA
Nascimento de Derrida (81 anos)

“Jacques Derrida (El Biar, Argélia, 15 de julho de 1930Paris, 8 de outubro de 2004) foi um filósofo francês, que iniciou durante os anos 60 a Desconstrução em filosofia. Esta "desconstrução", termo que cunhou, deverá aqui ser compreendido, tecnicamente, por um lado, à luz do que é conhecido como "intuicionismo" e "construcionismo" no campo da meta-matemática, na esteira da obra de Brouwer e depois Heyting, ao qual Derrida irá adicionar as devidas consequências dos teoremas da indecidibilidade de Kurt Gödel e, por outro, a um aprofundamento critico da obra de Husserl, Heidegger e Levinas na ultrapassagem da metafisica tradicional que ele vai apresentar como sendo uma "metafisica da presença".

[Jacques Derrida. Disponível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Jacques_Derrida. acesso em 14 jul 2011.]
Ilustração disponível em http://schizobehavior.blogspot.com/. Acesso em 14 jul 2011.




[1] Conspiração é a proximidade de alguém que respira o mesmo ar.
[2] Caro = “der. latinos: carìtas,átis 'ternura, afeição, amor' e 'careza'; na língua da Igreja serviu para traduzir o gr. agápé, designando a 'caridade', terceira virtude cardinal, e foi tomado às vezes como amor dilectìo para designar uma 'pessoa querida'; panromânico: it. carità, fr. charité, provç.cat. caritat, esp. caridad, port. caridade" [Houaiss]

5 comentários:

  1. Meu caro Garin,
    ou melhor,
    caríssimo colega Garin,
    quando escrevo o vocativo de uma mensagem eletrônica ou de uma carta, sempre tenho o cuidado de que o primeiro contato seja aquele que vai me apresentar junto ao meu interlocutor.
    Assim, devo dizer o quanto tua reflexão de hoje me é significativa.
    Com estima num dia delindo verão aqui no Hemisfério Norte,

    attico chassot

    ResponderExcluir
  2. Caro Chassot,

    de fato, nessa época internética, a gente sempre fica inseguro sobre qual seria o melhor tratamento para com algumas pessoas. Eu tenho um defeito grave: dificuldade de tratar com senhorias - vou sempre direto ao tu. Acho que a segunda pessoa, em que pese as regras protocolares, é mais honrosa e aproxima mais. Tem gente que não gosta de proximidades - nem quero discutir os motivos.

    Muito obrigado pelo teu comentário transatlântico.

    Um abraço,

    Garin

    ResponderExcluir
  3. Professor,

    Sempre achei a forma de tratamento "caro" muito impessoal, mas como é bom "ouvir" o outro.Refletimos, reconstruímos e aprendemos.
    Existem pessoas com as quais nos identificamos muito através de seus posicionamentos diante do mundo, embora não sejam da nossa convivência, do círculo familiar ou de amigos.Acredito que esta identificação transcende o físico e muitas vezes não achamos a forma mais adequada de nos dirigir à elas, pois bem, achei "perfeita" sua definição:"Acho que chamamos de ‘caro’[2] apenas àquelas pessoas pelas quais estamos dispostos a andar um uma milha a mais, mesmo não sendo do nosso círculo familiar."

    Um abraço e tenha um ótimo fim de semana meu caro professor Garin.

    ResponderExcluir
  4. Cara Rosana,

    é muito bom receber o teu comentário. Fico feliz por contribuir para ampliar a visão sobre uma termo tão corriqueiro e tão desconhecido por todos nós: para mim também não era diferente.

    Um forte abraço,

    Garin

    ResponderExcluir
  5. Parabéns! Li alguns de seus textos e gostei muito das analogias feitas. (Re) Pensar a vida é um ato grandioso, apenas os sábios o fazem com tanta contundência e sutileza!!!

    ResponderExcluir