terça-feira, 26 de julho de 2011

O GUILHERMINHO

O sino da Igreja Santo Antônio, em Cachoeira do Sul, badalava seis vezes marcando dezoito horas. Minha mãe acomodava uma cadeira de preguiçosa[1] ao fundo do pátio na qual minha avó sentava. Eu me acomodava num banquinho de madeira[2] junto dela e pedia que contasse a história do Guilherminho, um menino com medo que ouvia os uivos de um lobo no meio da noite, num campo aberto. Corria até cansar fugindo da possível fera que se aproximava. Exausto, deitava-se na relva aguardando o desfecho terrível. Surpreso, sentia seu cão lamber-lhe o rosto e, então feliz, recobrava as energias e voltava para o lar.
Era um ritual. Todos os dias, na mesma hora, no mesmo lugar e quase sempre a mesma história. Depois ela fazia a leitura do No Cenáculo[3] e as leituras bíblicas recomendadas para o dia. Numa oração curta, incluía os filhos e netos. Orava pelos que estavam presos e pelos que lutavam nas guerras. Com um solene ‘amém’, encerrava as preces e mamãe trazia o jantar. Depois disso, recolhia-se para seu quarto onde dormia antes que o sol se pusesse.
Essas lembranças são de um período anterior aos seis anos, quando meu pai trabalhava em uma indústria de bombas de recalque e meus irmãos estudavam no Primário. Tempos depois nos mudamos para a roça, onde passei o resto da infância e parte da adolescência.
Essa convivência com a vovó foi significativa na minha educação. Com ela aprendi diversas coisas, entre elas o valor do ritual, a importância da fé, a necessidade da disciplina e o significado da convivência com as pessoas mais velhas, que sempre têm muita sabedoria para compartilhar com as gerações mais novas.
Pois é, hoje é o dia dos avós e minha lembrança correu rápido para a minha avó materna, Cacilda Loreto da Cunha, falecida em 1971. A minha personalidade seria diferente, não fosse aquela convivência infantil. São doces lembranças de um tempo rico de entrega e de aprendizados.


DESTAQUE DO DIA
Dia dos avós
“Comemora-se o Dia dos Avôs e Avós[4] em 26 de julho. E esse dia foi escolhido para a comemoração porque é o dia de Santa Ana e São Joaquim, pais de Maria e avós de Jesus Cristo.
A data da festa de São Joaquim sofreu várias alterações ao longo dos tempos. Inicialmente era celebrada no dia 20 de março, associada à de São José, tendo sido depois transferida para o dia 16 de agosto, para associar-lhe ao triunfo da filha na celebração da Assunção, no dia precedente.”[5]



[1] Ilustração disponível em http://www.elo7.com.br/cadeira-preguicosa/dp/32BDB. acesso em 25 jul 2011.
[2] Ilustração disponível em http://www.artesanatobresler.com.br/produtos/39,0_Moveis.html. acesso em 25 jul 2011
[3] Ilustração disponível em http://www.educacional.com.br/metodista/met_recomenda0002.asp. acesso em 25 jul 2011.
[5] Dia dos Avós. Disponível em http://pt.wikipedia.org/wiki/Dia_dos_Av%C3%B4s_e_das_Av%C3%B3s. acesso em 25 jul 2011.

4 comentários:

  1. Meu querido colega Garin,
    curto a evocação do dia dos avós no teu blogue desde Paris. Já tendo o privilégio de viver o avonado, desejo a cada um e cada uma que vivem essa alegria que tenham sempre de seus netos estes dulçores. Àquela e àqueles que vivem a expectativa do advento deste ‘viver a vida’ que tenham então as merecidas alegrias,
    attico chassot

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  2. Caro Chassot,

    no ensejo deste Dia, quero cumprimentá-lo pelo avonado. Como estás longe, certamente estás curtindo a saudade dos teus netos, de abraçá-los fisicamente hoje.

    Um abraço do colega e amigo!

    Garin

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  3. COMENTÁRIO ENCAMINHADO POR E-MAIL pelo Prof. Carlos Augusto Normann:

    "os meus avós maternos são uma eterna e doce lembrança. Meu avô Otacílio era chegado a longas caminhadas, onde quer que estivesse. Curtia muito vir com ele do Centro a pé, cortando pela Redenção, vendo ele cumprimentar meio mundo...ir no Olímpico com ele, me iniciou na religião tricolor! Foi com ele que aprendi a conhecer as cidades, começando pelo Rio de Janeiro. Pegávamos algum ônibus, íamos ao centro antigo, palco de sua juventude, curtíamos a Lapa, o bonde de Santa Tereza, Copa, o Museu da Quinta da Boa Vista. Sempre fiquei na dúvida se o vô era mais gremista ou anticolorado, ou getulista que brizolista. Aliás, ele também...
    Minha avó, Eunice, a Vó Nice, era e é a pessoa mais doce que pisou este planeta. Sempre pronta para um longo papo com uma xícara de café inexplicavelmente forte para uma hipertensa (aliás, uma pessoa tão calma ser hipertensa era algo inexplicável), ela recebia a todos e todas na sua cozinha, desfiando longas conversas. As refeições naquela cozinha eram um ritual quase...pra começar que a vó cozinhava pra caramba, ela me fez gostar de cozinha e cozinhar, pois ficava de papo horas com ela na cozinha, vendo a magia toda acontecer nas panelas e formas.
    Nenhum dos dois era muito avançado nos estudos, muito embora meu avô fizesse cálculos de cabeça mais rápido e melhor que a caixa do supermercado. Já a vó devorava de dois a três jornais por dia. Uma época eu assinei pra eles a Folha de São Paulo. O vô, em sua experiência na expedição do Correio do Povo, elogiava a qualidade da impressão...disso ele sacava muito! A vó lia tudo, da política ao José Simão (adorava).
    O vô, na época da Legalidade, trabalhava na então Secretaria de Interior e Justiça com um trezoitão na gaveta, pra defender o Brizola com uma fidelidade perdigueira. O que é certo, é certo...muito vô Otacílio isso!!!
    A vó acolheu um certo amigo da mãe e da tia Hilda, o Domingão, nos anos 60...fugido da repressão em uma tristemente famosa ação do DOPS numa igreja metodista em São Paulo. Acolheu-o, pois "não gostava da ditadura militar". Acolher...essa palavra define a Nice!!!
    Puxa...não dá pra escrever pouco sobre eles...não dá pra escrever sem chorar gostoso, saudade quente e acalentadora..."

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  4. Caro Guto,

    percebe-se que a relação que tinhas/tens com os teus avós é marcada por muita emoção e compartilhamento.

    Um abraço,

    Garin

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