sexta-feira, 19 de agosto de 2011


INDIFERENTES
ANO 01 – Nº 161

Quarta-feira, quando dava aula para os cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda do Centro Universitário Metodista, do IPA, surgiu um debate muito interessante que me chamou a atenção. O tema era o Senso Moral. Depois de mostrar algumas fotos envolvendo cenas de crianças desnutridas[1] em solo africano, perguntei aos acadêmicos, o que aquelas cenas faziam com os seus sentimentos. Depois de um instante de silêncio, normal nessas circunstâncias, um aluno se animou: “para mim não fazem nenhuma diferença, já estou acostumado com essas fotos!”.
A partir dessa resposta a turma toda começou a se posicionar sobre o que a dor do próximo, mesmo que geográfica e historicamente distante, faz conosco. Entre as reações estava a de que a presença da miséria, tão constante no mundo contemporâneo, quase já não mexe mais com nossos sentimentos. A convivência cotidiana com moradores de rua, com crianças maltrapilhas nas sinaleiras, flanelinhas nas ruas, pedintes nos interfones, andarilhos nas estradas, parece que anestesia nosso senso moral. Aquilo que deveria nos horrorizar pela crueldade da fome, do abandono, da perda da dignidade, acaba se tornando mais um componente no cenário do dia-a-dia. Pouco a pouco vamos nos tornando insensíveis à dor alheia e jamais a sentimos como nossa responsabilidade. Até somos capazes de construir belos argumentos e justificativas racionais para esconder o afrouxamento de nosso senso moral. Aquilo que deveria nos revoltar torna-se apenas mais um personagem entre tantos que compõe o cotidiano.
A resposta do acadêmico não está equivocada. É isso mesmo que acontece com todo o mundo. São raros os casos de envolvimento honesto com os excluídos sociais. Uma colega de classe disse que prepara refeições, todas as semanas e as entrega a moradores de rua, juntamente com outras famílias que participam dessa ação solidária. Incompreensivelmente, quando estão fazendo essa obra meritória, recebem crítica de diversas pessoas que as acusam de estar alimentando vagabundos.
Parece que a música de Daniel Torres, [http://letras.terra.com.br/daniel-torres/722033/] está se concretizando ao inverso quando diz “Eu só peço a Deus que a dor não me seja indiferente”.
Pois é, estamos nos tornando indiferentes à dor do próximo, os que estão bem próximos, e os próximos que se encontram mais distantes. É urgente refletir, com honestidade, sobre isso, ou já não sei se podemos nos considerar humanos.


DESTAQUES DO DIA
Nascimento de Joaquim Nabuco[2]

Joaquim Aurélio Barreto Nabuco de Araújo nasceu em Recife a 19 de agosto de 1849 e faleceu em Washington a 17 de janeiro de 1910. Político, diplomata, historiador, jurista e jornalista brasileiro formado pela Faculdade de Direito de São Paulo, um dos fundadores da Academia Brasileira de Letras. Foi um dos grandes diplomatas do Império, além de orador, poeta e memorialista. Além de "O Abolicionismo", "Minha Formação" figura como uma importante obra de memórias, onde se percebe o paradoxo de quem foi educado por uma família escravocrata, mas optou pela luta em favor dos escravos. Nabuco diz sentir "saudade do escravo" pela generosidade deles, num contraponto ao egoísmo do senhor.

Dia Mundial Humanitário[3]

O dia 19 de agosto foi designado Dia Mundial Humanitário pela Assembleia Geral das Nações Unidas, em sua sessão plenária de 11 de dezembro de 2008, para homenagear todos os trabalhadores humanitários e funcionários das Nações Unidas que perderam suas vidas no cumprimento de suas missões e trabalhando na promoção da causa humanitária, apoiando as vítimas de conflitos armados. Na mesma ocasião foi aprovada a proposta da Suécia sobre "Fortalecimento da Coordenação da Assistência Humanitária de Emergência das Nações Unidas". Dezenove de agosto corresponde ao dia em que o Alto Comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Sérgio Vieira de Mello[4], designado como representante especial do Secretário Geral das Nações Unidas para o Iraque, além de outros 21 funcionários e colaboradores da ONU em Baghdad morreram tragicamente, durante o cumprimento de missão de paz, em 2003.


[1] Ilustrações disponíveis em http://clednews.blogspot.com/2011/02/de-partir-coracao-fome.html. acesso em 18 ago 2011.
[2] Joaquim Nabuco (texto e ilustração) disponível em http://pt.wikipedia.org/wiki/Joaquim_Nabuco. acesso em 18 ago 2011.
[3] Dia Mundial Humanitário. Disponível em http://pt.wikipedia.org/wiki/Dia_Mundial_Humanit%C3%A1rio. Acesso em 18 ago 2011.
[4] Ilustração disponível em http://e-south.blog.lemonde.fr/2007/10/02/vision-sergio-vieira-de-mello-une-vie-pour-la-paix/. Acesso em 18 ago 2011.

6 comentários:

  1. Meu querido colega Garin,
    Esta éa continuada preocupação: “para mim não fazem nenhuma diferença, já estou acostumado com essas fotos!” A anestesia de emoções é doloroso.
    Com admiração pela continuada presença em teu púlpito,

    attico chassot

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  2. Caro Chassot,
    obrigado pelas tuas visitas e comentários regulares. Já disse, mas repito: qualificas o meu blog.

    Um abraço,

    Garin

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  3. Mestre Garin,

    Comentando sobre a citação musical de Solo le Pido a Diós, ela é de autoria de León Gieco. Essa música, considerada uma das melhores composições argentinas de todos os tempos, foi composta em Cosquin por León. Ganhou versão em português pelas mãos de Raul Ellwanger, gravada por Beth Carvalho em dueto com Mercedes Sosa, e por vários outros cantores e grupos.
    É muito feliz da tua parte tê-la citado nessa blogada, Garin. Ela tem o peso de uma canção de exílio, de uma canção com teor profético, denunciando e anunciando. Os versos "desahuciado está el que tiene que marchar, a vivir una cultura diferente" calam fundo cantados por Mercedes Sosa, em uma de suas primeiras apresentações após seu exílio.
    Me espanta também a indiferença, o tamponamento emocional das pessoas. As fotos que mostraste, por mais que sejam correntes pela internet, sempre me deixam com aquela sensação de "por quê?" na mente...
    Um abraço,

    Guto Normann

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  4. Este comentário foi removido pelo autor.

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  5. Isso é desolador, as pessoas cada vez mais se "acostumam" com essas cenas! Tudo parece ser normal, acontece a todo hora, pessoas sendo assasinadas, estupro etc, etc...As vezes tenho muito receio (ou medo mesmo) do que será dos jovens de hoje no futuro...

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  6. Caro professor,

    acredito que as pessoas não se tornam indiferentes, apenas não têm consciência da realidade e do seu papel no mundo. Acomodar-se é mais fácil.
    Há pessoas que precisam de alimento para o corpo, mas existe aquelas que precisam alimentar a alma, para que tenham consciência de si e do mundo que os rodeia.

    É sempre um prazer ler seus textos!

    Um forte abraço,
    Zana

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