terça-feira, 26 de junho de 2012

O desaparecimento de Deus - ANO 02 – Nº 471


O DESAPARECIMENTO DE DEUS

Às vezes me surpreende como rendem as leituras de esteira[1]. Ontem, por exemplo, percebi que já estou chegando quase ao final de um livro de mais de trezentas páginas, lido exclusivamente enquanto faço meus exercícios matinais. Reconheço que nem todos têm essa facilidade: é música alta, gente conversando, outros contando piada e rindo, há quem provoque barulho com os ferros quando termina sua série e por aí afora. Entro para dentro do livro e vou percorrendo cada linha saltitando de palavra em palavra. Quando me dou conta a esteira já está denunciando quarenta e cinco minutos, uma hora...

Ontem, uma parte chamou minha atenção de maneira especial. Falava sobre a forma como Deus, que aparece na Bíblia como senhor todo poderoso, criador de todas as coisas, vai desaparecendo gradativamente até sumir completamente:

Aí aos poucos, Ele vai desaparecendo e, no Novo
Testamento, desaparece por completo e manda o
filho em forma humana – não é nem um anjo, é uma
forma humana; uma coisa meio complicada você ter um
Deus homem – e depois, puf, acabou. Some. E aí reaparece
como uma internalização (não sei se esse é o termo
teologicamente correto, mas é como vejo a coisa),
quer dizer, Ele deixa de ser uma presença explícita
– está lá o arbusto queimando ou o filho de Deus –
para uma entidade que existe dentro das pessoas.[2]

A forma como o ser humano entende as manifestações divinas se modificam na mesma proporção em que o contexto social se altera. Em diferentes etapas da história a forma como lidamos com o sagrado muda porque mudam as necessidades. Em meio à guerra sentia-se a necessidade de que fizesse o sol parar para que os guerreiros tivessem mais tempo para realizar sua tarefa de vingar-se dos inimigos[3]. Noutra época foi entendido como um pastor que acalmava e consolava o povo preparando para um novo período de harmonia[4].

Chega o momento em que a percepção de uma divindade assombrosa e de poder desaparecesse completamente para emergir na forma de uma energia que nascia de dentro para fora em manifestações desordenadas, revelando as entranhas de uma gente emocionada[5].

Quando conseguimos perceber essa multiforma de apresentação do sagrado compreendemos um pouco mais as ansiedades do ser humano em sua busca pela sua própria identidade.

Votos de uma terça-feira de reflexões sobre si mesmo!
DESTAQUE DO DIA

Morte de Stirner (156 anos)

Max Stirner, pseudônimo de Johann Kaspar Schmidt, nasceu em Bayreuth a 25 de outubro de 1806 e morreu em Berlim a 26 de junho de 1856. Foi um escritor e filósofo alemão, com trabalhos centrados no existencialismo, niilismo e no Anarquismo individualista.

Egoísmo: somente quando as pretensas à falsa autoridade de tais conceitos e instituições são revelados é que a verdadeira ação, poder e identidade dos indivíduos podem emergir. A realização pessoal de cada indivíduo se encontra no desejo de cada um em satisfazer seu egoísmo, seja por instinto, sem saber, sem vontade - ou conscientemente, plenamente a par de seus próprios interesses. A única diferença entre os dois egoístas é que o primeiro estará possesso por uma ideia vazia, ou um espanto, na esperança de que sua ideia o torne feliz, já o segundo, pelo contrário, será capaz de escolher livremente os meios de seu egoísmo e perceber-se enquanto fazendo tal.

Somente quando o indivíduo percebe que lei, direito, moralidade, religião, etc., são nada mais que conceitos artificiais e não autoridades sagradas a serem obedecidas é que poderá agir livremente.

Argumenta-se que o egoísta de Stirner exerceu enorme influência no homem para além do homem de Nietzsche. O pensamento de Nietzsche às vezes lembra tanto o de Stirner, que Eduard von Hartmann o chamou de plagiador.[6]


[1] Leituras realizadas enquanto se faz caminhada sobre a esteira elétrica.
[2] BETTO, Frei; GLESER, Marcelo; FALCÃO, Waldemar. Conversas sobre fé e ciênca. Rio de Janeiro: Agir, 2011, p. 278.
[3] Js 10.12-15.
[4] Is 40.1-3.
[5] At 2.1-13.
[6] MAX STIRNER. Disponível em http://pt.wikipedia.org/wiki/Max_Stirner. Acesso em 26 jun 2012.

2 comentários:

  1. Meu caro Garin,
    pois na minha academia a um tempo resolveram 'modernizar' as esteiras,e as novas deixaram de ter o atril para postar o livro, Um retrocesso, pois considero o esteirar algo muito monótono.
    Muito boas leituras,
    attico chassot

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    1. Amigo Chassot,
      na minha academia também não há atril - posto o livro sobre aqueles relógios e o seguro com uma mão - é o jeito.
      Um abraço,
      Garin

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