quarta-feira, 6 de junho de 2012

Sem idade - ANO 02 – Nº 451


SEM IDADE

Nas primeiras terças-feiras de cada mês, faço uma palestra para um grupo de senhoras da minha Igreja. Todas já fazem parte, assim como eu, da terceira idade. Ontem estivemos conversando sobre “A Idade da Velhice”. A resposta que buscamos foi em qual idade a gente fica velho? Evidentemente, é uma pergunta simplista até porque a gente não possui apenas uma idade. Entretanto, a pergunta apareceu no corredor de uma provocação.

É possível imaginar as múltiplas tentativas de resposta que a turma apresentou. Entre tantas bem humoradas esteve aquela, vinda de uma senhora de noventa e um anos: “eu não sei, não fiquei velha ainda!”. Nesse contexto apresentei a observação de Milan Kundera[1] sobre uma senhora de mais de sessenta anos, à beira da piscina:

“Ela foi embora, de maiô, andando ao longo da piscina
e quando já tinha ultrapassado o professor de natação
aproximadamente uns quatro ou cinco metros, virou a
cabeça para ele, sorriu, e fez um gesto com a mão. Meu coração
apertou-se. Esse sorriso, esse gesto eram de uma mulher
de vinte anos!” (KUNDERA, Milan. A Imortalidade)

Na narrativa, Kundera compara a leveza e a sensualidade daquela aluna ao cumprimentar o professor lançando sérias dúvidas sobre a sua idade. Em outro momento ele diz: “Talvez só tomemos consciência de nossa idade em certos momentos excepcionais, sendo na maior parte do tempo, uns sem-idade.”

Pois é, depois de termos passeado pela noção de que nenhum de nós era mais velho do que aquele menino ou menina saltitante da sua própria puberdade, acabamos concordando com Kundera: somos sem idade!

Pode ser que nosso corpo apresente limitações, mas quem não as tem? Pode ser que a gente sinta uma dor aqui, outra ali, mas quem nunca sentiu dor? Pode ser que a sociedade ainda nos discrimine, mas quem não a sofreu um dia? Pode ser que nossa agilidade não seja a mesma, mas quem nunca derrubou um copo? Experimentar, em toda a sua largueza esse tempo, com alegria e satisfação manifesta a nossa não idade, de agora... e de sempre!

Com votos de uma ótima quarta-feira para todos os sem idade!
DESTAQUE DO DIA

Morte de Jankélévitch (27 anos)

Vladimir Jankélévitch nasceu a 31 de Agosto de 1903 em Bourges e morreu a 6 de Junho de 1985 em Paris. Foi um filósofo e musicólogo francês, filho de pais russos que haviam emigrado para a França para fugir do antissemitismo de seu país de origem. Seu pai foi um dos primeiros tradutores de Sigmund Freud na França, e também traduziu obras de Hegel, Schelling, Croce e Berdyayev. Em 1922 Jankélévitch começou a estudar filosofia na École Normale Supérieure em Paris, onde teve aulas com Bergson. De 1927 a 1932, foi professor no Institut Français em Praga, onde ele escreveu o seu doutorado sobre Schelling. Ele retornou para a França em 1933, quando foi professor na Lycée du Parc em Lyon e muitas outras universidades, incluindo Toulouse e Lille. Em 1941, aliou-se à Resistência Francesa e, após a guerra, em 1951, foi nomeado para a cadeira de Filosofia Moral de Sorbonne, onde lecionou até 1978. Em 1958 participou na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa numa conferência sobre temas filosóficos. Ali formou várias gerações, com seus temas morais e metafísicos, marcados pelo seu pensamento agnóstico, mas também com seus cursos monográficos, que traduziram-se em ensaios polêmicos, muito ricos em ideias literárias.[2]


[1] Romancista Tcheco, nascido em 1929, atuamente vive na França desde 1975 e é autor do famoso livro, A Insustentável Leveza do Ser.
[2] WLADIMIR JANKÉLÉVITCH.   http://pt.wikipedia.org/wiki/Vladimir_Jank%C3%A9l%C3%A9vitch. Acesso em 6 jun 2012.

2 comentários:

  1. Meu caro (quase) coetâneo, linda a narrativa que fazes com o texto de Kundera.
    Entendi um pouco porque ontem ao deixara a sala de aula depois das 22h50min um devo ter me sentido como a 'aluna sem idade'.
    Muito obrigado,
    attico chassot

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    1. Amigo Chassot,
      pois é, cada vez mais estou percebendo que somos todos um sem idade. O diabo da sociedade competitiva de mercado nos incutiu que somos velhos - assim tenta nos vender a 'jovialidade' embaladas em potes, vidros e sachés.
      Um abraço,
      Garin

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